domingo, 7 de junho de 2009

A hipocrisia das bombas nucleares

Nas útlimas semanas o mundo tremeu diante dos novos testes nucleares e de lançamento de mísseis por parte da Coréia do Norte. Países do mundo intero (inclusive o Brasil) têm condenado as ações do Estado Norte-Coreano e dizem que o possível desenvolvimento de armas nucleares por este Estado representa uma ameaça à segurança internacional. Qual o diagnóstico? Pura hipocrisia!

Há muito a Coréia do Norte é difamada no meio internacional. Sub-produto das disputas de influência entre EUA e URSS durante a Guerra Fria, a parte norte da península da Coréia foi a parte soviética do espólio após a derrota do Japão na Segunda Guerra Mundial. Hoje a Coréia do Norte é um país isolado, com pouquíssimas relações com outros países e imensamente atrasado economicamente. O programa nuclear desenvolvido pelo presidente Kim Jong-il foi a gota d'água na difamação internacional do país.

Os críticos do regime norte-coreano, dentre os quais se destacam os Estados Unidos (não importa o presidente), classificam a Coréia do Norte como um "rogue-state" (um "Estado-ladino") que desrespeita as normas do direito internacional e cuja aquisição de armamento nuclear representaria ameaça para o mundo inteiro.

Em primeiro lugar, o próprio conceito de rogue-state é uma das classificações mais arbitrárias que existem na política internacional hoje. Coincidentemente, os países classificados como rogue-states são adversários históricos dos EUA (Irã, Síria, Coréia do Norte e todos os demais integrantes do "eixo do mal" de George W. Bush). São países que se recusam a seguir as "recomendações" de Washington e constituem "ameaça à paz e à segurança internacionais" por defender os seus valores nacionais. Ora, professar o liberalismo e a economia de mercado é ótimo, mas defender o islamismo ou o comunismo é ameaça...

Mas a maior dúvida não é esta. Quando um "Estado-ladino" que mal consegue se sustentar lança alguns mísseis e detona ogivas nucleares no subterrâneo é considerado ameaça. Entretanto, esse projeto está ainda em fase embrionária. Não se sabe a capacidade real de uso da tecnologia por parte da Coréia do Norte. Enquanto isso, outros países que se dizem pacíficos dormem em cima de arsenais nucleares grandes o bastante para devastar o planeta inteiro.

Por que a Coréia do Norte com alguns testes representa um perigo tão grande e países como Israel, Índia e Paquistão nem aparecem no noticiário? Índia e Paquistão possuem cada um mais de 50 ogivas nucleares e mísseis capazes de detonar tais ogivas nas capitais do inimigo. São países que há muito lutam pelo domínio da região da Caxemira e estão em guerra constante. O que impede esses dois de dispararem seus mísseis e mandar um e o outro pelos ares? E quanto ao Estado de Israel, que possui um arsenal razoável (apesar de ninguém reconhecer oficialmente, ninguém minimante sensato duvida disso) e vive em guerra constante com seus vizinhos árabes desde a sua fundação? O que impede que Israel use dessas armas para "se defender" contra seus inimigos próximos? E, mais importante de tudo, por que esses Estados adotam as mesmas práticas armamentistas da Coréia do Norte e, mesmo assim, não são punidos ou sequer criticados?

Além do "baixo clero" das potências nucleares, vejamos os mais antigos detentores desse mecanismos de destruição. EUA, Rússia, Reino Unido, França e China foram os primeiros a desenvolver armas nucleares e mísseis, além de possuírem os maiores arsenais do mundo*. Coincidentemente, estes países, que são os 5 maiores fabricantes de armas do mundo, são também os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, cuja missão é zelar pela paz e segurança mundiais. Há algo de podre no reino das Nações Unidas...

Por fim, a maior hipocrisia de todas. Enquanto demonizam a Coréia do Norte e seus líderes, o governo dos Estados Unidos, mesmo após terem assinado o Tratado de Não-Proliferação (TNP), gastam grandes quantidades de seu orçamento no desenvolvimento de novas armas nucleares e novos mísseis para lançá-las. Os "mantenedores da paz" possuem nada menos que mais de 5 mil ogivas em seus arsenal, além de tecnologia capaz de detoná-las em qualquer lugar do mundo. Além disso, os EUA possuem uma ficha nada limpa nesse quesito. Vale a pena lembrar que os EUA são o único país a ter usado armas nucleares em situação real de conflito até hoje. Suas duas bombas atômicas lançadas no Japão vitimaram mais de 170 mil pessoas instantaneamente (sem contar as consequentes mortes pela radiação, os danos às gerações futuras e ao meio-ambiente). Enfim, com que moral vêem os Estados Unidos criticar a Coréia do Norte por desenvolver armas nucleares?!?

Deixando de lado a política e considerando apenas a matemática: qual será a maior ameaça? As menos de dez bombas norte-coreanas ou o modesto arsenal norte-americano de mais de 5 mil ogivas, mísseis balísticos inter-continentais e centenas de bombardeiros estratégicos (alguns invisíveis ao radar)? Claro que a Coréia do Norte é o perigo. Afinal, é um "Estado-ladino", não respeita o direito internacional e defende o comunismo! E os EUA? Não, eles não representam perigo pra ninguém! Afinal, são defensores do liberalismo, da economia de mercado, do livre comércio e de tudo que é bonito nesse mundo...

Caso claro do sujo falando do mal lavado (e, nesse caso, a sujeira é nuclear)!

*Quadro resumo:

País: Ogivas nucleares/Testes realizados
EUA:
5.200/1.032
Rússia: 4.138/715
França:
300/210
Reino Unido:
160/45
China:
45/45
Índia:
60/3
Paquistão:
60/2

Fonte: Reuters, Arms Control Association

Luiz Gustavo Aversa Franco
Brasília-DF, 07 de junho de 2009

Um comentário:

Tamirez Paim disse...

Compartilho da mesma opinião. Pricipalmente os EUA que têm mais ogivas nucleares circulando por aí do que nós próprios pudemos supor. Os seus submarinos são movidos à energia nuclear , ou seja, bombas-peixes. Brincadeiras à parte, a verdade é que é isso aí. Sim, existe algo errado nisso tudo.

Ótimo texto! Adorei! Abração!