sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Eleições presidenciais nos EUA


Na próxima terça-feira, dia 4 de novembro, as escolhas de milhões de pessoas decidirão o futuro do mundo inteiro nos próximos anos. Esta é a realidade da dimensão alcançada pela eleição do presidente dos EUA. Sua importância é conhecida, mas não se pode cair no senso comum dos extremismos da mudança radical ou da completa permanência estática.
Não se pode acreditar que se trata de um duelo entre o bem e mal encarnados ou que não importa o vencedor as coisas não se alterarão. Há muitas variáveis em jogo. Esta eleição em especial traz ainda mais aspectos a serem considerados. Sim, se trata do fato de um dos candidatos ser negro. Devemos lembrar que, em uma sociedade altamente conservadora como a americana, em que todos os presidentes (sem exceção) foram homens brancos e protestantes, um negro de ascendência estrangeira representa uma mudança de pensamento e atitude consideráveis.

É obvio que alguns aspectos permanecerão os mesmos. Mesmo se McCain for vitorioso, os EUA manterão seu protecionismo (inclusive em relação ao etanol brasileiro). Se houver vitória de Obama os EUA manterão certo belicismo inerente de sua política externa. O que realmente muda é o grau em que estes aspectos permanecerão ou mudarão, o que depende em boa parte do vencedor das eleições.
Não há dúvida de que, independente de quem tiver a presidência em 2009, o próximo presidente dos EUA terá desafios descomunais ao assumir o país após o desastroso governo Bush. Vários serão os obstáculos ao novo presidente, entre eles a crise econômica que assola o mundo e a já bem conhecida guerra no Iraque. Aqui as decisões do próximo presidente serão fundamentais.
A estratégia adotada para combater a crise na economia americana terá impactos profundos no mundo inteiro pelos próximos anos. Os erros e acertos do próximo presidente e sua equipe podem determinar boa parte dos acontecimentos chaves da economia mundial.
Talvez o mais importante assunto imediato da política externa do próximo governo será a situação do Iraque. Os EUA permanecerão com uma ocupação desgastada em um conflito sem esperanças? As tropas americanas permanecerão no país apenas para terem seu contingente diminuído gradualmente enquanto milhares de civis inocentes morrem no fogo cruzado ou o futuro presidente terá bom senso e trará seus soldados de volta para casa? Tudo depende das decisões do próximo presidente.
O futuro é bastante incerto, em especial agora. As vidas e o futuro de boa parte do mundo serão decididos nesta fatídica terça feira. E não conta somente a decisão dos eleitores americanos, mas também de outros "atores externos". Não se deve esquecer da eleição de 1968, há exatos 40 anos quando os EUA também estavam atolados em uma guerra inútil e um jovem senador propunha mudanças, algumas consideradas "radicais demais" por alguns setores (alguns deles com armas na mão). Os eleitores decidiram pela mudança, e alguns decidiram pela violência, assassinando Bob Kennedy, irmão do famoso JFK assassinado em 63.
Será esse o destino desta eleição? As pesquisas de opinião se confirmarão e Obama será o vitorioso? E se for, ele sobreviverá para assumir o cargo? Ou a maldição dos irmãos Kennedy cairá sobre Obama como uma ironia sombria do destino?
Somente o tempo dirá...

sábado, 4 de outubro de 2008

A crise fiscal do capitalismo - Uma segunda opinião

Entrevista do professor Carlos Pio, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (IREL/UnB), à UnB Agência sobre a atual crise financeira:
http://www.secom.unb.br/entrevistas/entrevista.php?id=49

É sempre bom ouvir a opinião de pessoas entendidas do assunto, como o professor Pio, sem dúvida um grande especialista em economia política internacional. Entretanto, informações técnicas bastante construtivas à parte, ainda há a presença de forte ideologia liberal em seu discurso.

"Não dá para questionar o liberalismo por uma crise como essa, porque não há alternativa melhor para gerar riqueza e incluir gente."

Com todo o respeito à posição política do professor Pio, sou obrigado a discordar veementemente de sua afirmação acima. Não há provas empíricas que comprovem essa boa ação do sistema neoliberal. Embora o sistema neoliberal seja capaz de gerar grandes riquezas, ainda é incapaz de distribuir tal riqueza de maneira adequada. Como explicar que na Rússia, um dos países que mais abriu sua economia após o fim da URSS, várias pessoas vivem em condição econômica muito pior que nos tempos do regime socialista?

Talvez esta crise em específico não seja a gota d'água, mas sua simples eclosão mostra o quão voláteis são as bases da ideologia neoliberal e o quanto o sistema desenvolvido por seus seguidores é inseguro e capaz de (literalmente) evaporar grandes riquezas e afundar países inteiros em grandes crises. O neoliberalismo provavelmente sobreviverá a esse baque, mas não restam dúvidas de que sua estrutura caduca se encontra em fase terminal.


sexta-feira, 3 de outubro de 2008

A crise fiscal do capitalismo


Na década de 80, novos chefes de governo no mundo capitalista começaram a pregar um novo tipo de economia política totalmente diferente, com idéias de “Estado mínimo” e “livre mercado”, que diziam eles impulsionaria o desenvolvimento econômico e seria a solução para os problemas do capitalismo. Foi assim que Margaret Thatcher no Reino Unido, Ronald Reagan nos EUA e Helmunt Kohl na Alemanha propagaram o Neoliberalismo.

Mais de 20 anos se passaram e o Neoliberalismo ganhou status de verdade absoluta, quase como um credo sagrado incontestável. Seus críticos são sempre taxados de “comunistas retrógrados que ainda vivem na URSS”. O Neoliberalismo comportou-se quase como um político em campanha, prometendo desenvolvimento para ricos e pobres, diminuição das desigualdades livre acesso a todo tipo de bens de consumo para todos. Tudo graças ao Mercado, uma entidade quase divina de tão poderosa e perfeita. Trata-se do ápice da utopia capitalista.

Os acontecimentos das últimas semanas têm mostrado o quão utópica é essa idéia. O tal idolatrado livre mercado entrou em parafuso, e levou as maiores bolsas de valores do mundo a despencarem vertiginosamente, causando altas de preços, enormes perdas financeiras e altas inflacionárias (o maior dos castigos para os membros da seita neoliberal). E agora, quando o capitalismo financeiro está no fundo do posso quem vem ao seu socorro? Seu antes arquiinimigo a quem o neoliberalismo pregava o (quase) desaparecimento: o Estado.

Mais uma vez o Neoliberalismo se comporta como um político, pois prometeu mundos e fundos (literalmente) e o que deu ao mundo? Uma crise de grandes proporções. Muito antes de a febre neoliberal tomar conta do mundo nos anos 80, um cientista político americano chamado James O’Connor já previa o desastre da economia capitalista*. Analisando a crise econômica que assolava os EUA na década de 70, O’Connor apresentou a formula da elaboração da crise fiscal capitalista: no capitalismo há a socialização dos custos, mas os lucros continuam a ser apropriados pelo capital privado. Tal descompasso só pode levar a uma crise fiscal. Outra contribuição de O’Connor foi desmascarar a maior das mentiras do liberalismo econômico: que o Estado é um peso morto e deve ser dissociado da economia. O’Connor mostrou que, ao contrário, o Estado e o maior consumidor na economia capitalista.

O’Connor escreveu sua obra na década de 70 e hoje, em 2008, suas idéias se mostram mais verdadeiras que nunca. Era óbvio que o sistema capitalista financeiro caminhava para tal desastre. Nos 20 anos que se passaram desde a era Thatcher/Reagan as disparidades entre ricos e pobres apenas aumentaram, a dicotomia entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos tornou-se mais evidente, e vários bens de consumo fundamentais (principalmente os alimentos) têm se tornado inacessíveis para a grandes parcelas da população pobre, graças à especulação financeira, “coincidentemente” uma das principais causas da crise atual.

Esta crise pela qual o mundo está passando serve de lição. Não se pode confiar no capitalismo. Trata-se de um sistema de soma-zero, para que um ganhe alguém tem que perder. O abismo entre aqueles que custeiam o desenvolvimento com a socialização das despesas e aqueles se enriquecem com a apropriação privada dos lucros tornou-se tão grande que aparece todo dia nos jornais e televisões: enormes perdas financeiras e desespero no mundo todo.

A prova última da grande mentira que é o Neoliberalismo vem justamente em seu momento de salvação. O Neoliberalismo há anos repugna a intervenção estatal na economia e critica os gastos do Estado em áreas que deveriam ser do setor privado, mas ao mesmo tempo condena qualquer tipo de reivindicação trabalhista, invocando a atuação da “mão forte do Estado” para defender o patrimônio privado contra os ataques terroristas de “sindicalistas retrógrados de esquerda”. Esse mesmo Neoliberalismo agora depende do maior Estado da terra, o Estado norte-americano, para ser retirado da própria cova antes que seja enterrado. Na última segunda-feira, a Câmara dos Deputados dos EUA recusou um mega pacote de ajuda financeira elaborado pela Casa Branca para salvar os principais bancos privados (que constituem os verdadeiros pilares do sistema financeiro neoliberal) justamente por uma questão ideológica. Como um político norte-americano, que há 20 anos defende a não-intervenção estatal na economia pregando a livre atuação do mercado como solução para todos os problemas de seu eleitor, vai votar a favor de uma proposta que é totalmente oposta a sua ideologia? Seria admitir o próprio erro. O Senado já aprovou o programa, com algumas alterações, e agora o envia de volta Câmara para que os deputados decidam o futuro da economia mundial. Será que os políticos norte-americanos reconhecerão que por 20 anos enganaram seus eleitores? Será que eles admitirão o próprio erro e deixarão seu orgulho de lado para fazer o que é necessário (na visão dos neoliberais)?O que importa é que a única salvação para o sistema capitalista neoliberal é o investimento de quase US$1 trilhão (quase o valor do PIB do Brasil, 10ª maior economia do mundo) por parte do Estado. Tudo isso só serve para mostrar a verdadeira “promessa de político” que é o ideário neoliberal.

*O’CONNOR, James. EUA: A Crise Fiscal do Estado Capitalista.